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Guloseimas e pensamentos...

15.4.08

Mídia justiceira...

“Cada ato mesquinho nosso faz retroceder de mil passos qualquer esperança que possa restar quanto ao nosso futuro”. W. Reich

“Horror íntimo ou vocação coletiva para envergar a toga? Catarse pessoal ou sumarização da justiça? Tragédia ou circo midiático? A morte da menina Isabella Nardoni toca na emoção do país inteiro, qualquer que seja a conclusão do inquérito.”

Assim começa o texto de Alberto Dines, em sua coluna no site Observatório da Imprensa. Sim, concordo com o fato deste crime ser algo que mexe com a gente e que não deve ser esquecido, argumento por ele defendido no texto citado. Entretanto, me horroriza o tratamento dado pela imprensa a mais este crime.

Uns dirão que é algo para encobrir as palhaçadas políticas que acontecem em nosso país, outros para dissimular a blindagem “roussefiana”, outros ainda argumentarão que esquecemos da fome, da inflação crescente, da incompetência do diretor da ANP, da crise imobiliária norte-americana, dos demais crimes contra crianças, da tentativa de resgate de criminosos em ação de guerrilha numa prisão de segurança máxima etc.

Tudo isso pode ser verdade, tanto a visão de que um crime como esse nos comove e nos emociona, tanto quanto às práticas possivelmente maquiavélicas de alguns jornalistas na mídia brasileira. Não sei, mas toda esta atenção dada ao caso Nardoni, me remete ao ocorrido com a Escola de Base de São Paulo, onde os “culpados” eram inocentes.

Para quem não se lembra, em março de 1994, a imprensa publicou reportagens sobre seis pessoas que estariam envolvidas no abuso sexual de crianças, alunas da Escola Base, localizada no Bairro da Aclimação, em São Paulo. Jornais, revistas, emissoras de rádio e de tevê basearam-se em fontes oficiais - polícia e laudos médicos - e em depoimentos de pais de alunos. Tratava-se de um erro. Quando foi descoberto, a escola já havia sido depredada, os donos estavam falidos e eram ameaçados de morte em telefonemas anônimos. O que será do caso Nardoni?

Não dá para se ouvir ou ver um noticiário, sem que abram com este assunto e encerrem com o mesmo. Pérolas nos são ofertadas de forma incessante como o seguinte diálogo (com muito sarcasmo de minha parte, mas real em seu conteúdo):

- Caro repórter Epaminondas da Silva, o que aconteceu hoje às 8h da manhã, na 70ª Delegacia dos Casos Estapafúrdios?

- Joeney Magalhães, jornalista e apresentador de telejornal da Patativa News, o delegado que cuida do caso ainda está tomando seu breakfast em sua residência e não chegou para nos dizer que não tem nada a dizer.


Ou então este outro:

- A repórter Celestina Ambrósio está na Delegacia da Vila do Norte, onde a ré (a madrasta mal era considerada suspeita ainda) A. C. está detida dando depoimento. Olá Celestina Ambrósio, o que tem a nos contar?

- Olá Valdisnei Espíndola, a ré, culpada pela morte da menina e também pela guerra do Iraque, nem almoçou ainda apesar de já passar do meio dia e continua com mesma roupa com que foi presa no dia de ontem. Uma combinação horrível de calça jeans washed com escarpim dourado e uma blusa de petit pois rosas e brancos...


É óbvio, que sou a favor da liberdade de imprensa e a única censura que permito é a minha própria consciência, e que uso sem parcimônia, mudando de canal, desligando o rádio ou não lendo um texto sobre um assunto, quando este me passa a idéia de sensacionalismo. Prefiro os fatos crus.

Mas não penso que seja demais, pedir aos responsáveis pelos órgãos de imprensa, que esqueçam um pouco o resultado dos pontos no Ibope e passem a tratar o jornalismo com a ética necessária.

Não sou um Homer, meu caro Bonner!


PS: quem tiver curiosidade para saber mais sobre o caso Escola Base e a ética na nossa imprensa, terão acesso nos links abaixo:

http://recantodasletras.uol.com.br/arquivos/144114.pdf

http://www.jornalismo.ufsc.br/bancodedados/karam-escolabase.html